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Escândalos, empresas e Lei de Improbidade

Por Ariosto Mila Peixoto e Saulo Stefanone Alle*

 

Às vezes as empresas se esquecem de que estão sujeitas às sanções da Lei de Improbidade Administrativa. Diante de uma situação de crise, preocupam-se com os impostos e multas, com as ações criminais contra colaboradores, com as penas da Lei de Licitações, mas se esquecem das sérias consequências de uma ação de improbidade. Talvez a causa esteja associada a uma tradição (que está mudando) de negligenciar o combate à improbidade, ou mesmo a uma compreensão equivocada das condições de aplicação da lei.

Julgados recentes comprovam que as empresas estão sujeitas à Lei de Improbidade e podem sofrer sanções graves, inclusive pecuniárias, impedimento de contratar com o Poder Público, de receber incentivos – inclusive creditícios – e, ainda, sofrerem um desgaste relevante de sua imagem. Na verdade, a mera inclusão no polo passivo já acarreta efeitos negativos. Exemplos reais mostram que o envolvimento em uma investigação por corrupção e improbidade afeta as relações com a administração pública e faz reduzir o faturamento – sem mencionar os impactos para o mercado privado.

Fomentar a consciência de que escândalos de corrupção estão associados ao risco de sanções por improbidade é o começo, mas é preciso compreender corretamente quais as condições de aplicação da lei. Alguns pensam que seja necessário comprovar o dano pecuniário ao ente público para que a empresa responda por improbidade – o que não é bem assim. Outro erro é pensar que uma vez pago ou parcelado o débito fiscal (antes evitado pela propina), todo problema se resolveria. E, ainda, que o dolo específico deveria ser sempre comprovado, quando a mera culpa já é suficiente em certos casos.

Julgados recentes mostram que as empresas estão sujeitas à Lei de Improbidade e podem sofrer sanções graves

Essas teses “equivocadas” não fazem parte da dinâmica da lei, e muito menos do imaginário do Ministério Público, para quem essa norma serve para reprimir determinados comportamentos desonestos. O ministro Ari Pargendler, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao fundamentar um recente julgado, reforçou tal objetivo: “é a desonestidade que está sendo punida, pelo seu valor intrínseco.” Essa referência ao comportamento “probo” – e não a mera constatação de haver ou não danos ao erário – é que deve guiar a avaliação de riscos e estratégias da empresa.

Uma decisão do STJ é paradigmática, nesse sentido. No caso julgado, uma empresa sofreu a pena de proibição de contratar com o poder público e de receber incentivos fiscais ou creditícios por três anos, simplesmente porque teria se beneficiado de informações obtidas por um de seus sócios, agente político na época. A empresa adiantou-se em pedir o sequestro de valores que (soube de forma privilegiada) seriam pagos a um devedor seu, por um órgão público. Segundo o julgado, houve violação aos princípios da administração (art.11, da Lei nº 8.429/92) pelo acesso irregular, por atuação de um agente do Estado, aos dados que lhe foram favoráveis, mesmo sem danos ao erário ou enriquecimento indevido da empresa.

Portanto, as empresas não podem desconsiderar essa perspectiva, nas relações que envolvam a administração pública e, sobretudo, nas situações de crise. É importante identificar riscos, fragilidades, culpados, se há e que práticas foram efetivamente desenvolvidas à margem da política da empresa e da lei. O departamento jurídico deve identificar se “a empresa” é uma vítima (ou parece uma vítima), se tinha consciência da prática ilegal (e quem tinha ou não tinha) e se agiu como se pretendesse tirar alguma vantagem disso.

Enfim, qualquer estratégia preventiva (da sua inclusão no polo passivo da ação) ou defensiva deve ser desenhada a partir de uma realidade conhecida nesse contexto. O caso da máfia dos fiscais do ISS de São Paulo traz uma lição, a de que diante de um escândalo, seja em matéria fiscal ou contratações públicas, as empresas devem preocupar-se com a Lei de Improbidade, ante sua dinâmica, condições e objetivos corretamente entendidos. E, a partir do entendimento preciso e adequado da situação, devem se posicionar, tão logo quanto possível, de forma compatível com a imagem que se esforçaram para construir.

Por outro lado, é importante lembrar que o advento da nova Lei Anticorrupção não significa a superação da Lei de Improbidade, mas o fortalecimento de um sistema. Em outras palavras, o que a soma dessas normas nos diz, na verdade, é que se a Lei de Improbidade era aplicada com mais timidez (pelo menos essa era a percepção comum) e isoladamente, agora ela se insere num conjunto de mecanismos em processo de aprimoramento, que tende a torna-la mais evidente e fortalecida.

Portanto, apesar de suas limitações, a Lei de Improbidade é aplicável às empresas (e continuará sendo, talvez com mais ênfase) e seus riscos não devem ser negligenciados – especialmente em casos envolvendo fraudes fiscais e licitações. As sanções são severas, mas as consequências do envolvimento em uma ação de improbidade já são, por si, relevantes para o valor e para as atividades da empresa. Por isso, quanto antes e mais realistas os prognósticos e estratégias forem traçados, melhor.

*Ariosto Mila Peixoto e Saulo Stefanone Alle são, respectivamente, especialista em licitações e contratos públicos, sócio fundador de Ariosto Mila Peixoto Advogados; mestre e doutorando em direito internacional pela USP e advogado na mesma banca.

Fonte: Valor Econômico (21/05/2014)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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